ARTIGO: O desconhecido futuro político

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Bruno Dourado Bertotto Martins.

Cruze algumas informações sobre Donald Trump, presidente dos Estados Unidos da América, Emmanuel Macron, presidente recém-eleito da França, e, João Dória Júnior, prefeito de São Paulo. O que os assemelha?

Apostas. Figuras conhecidas na sociedade, simultaneamente desconhecidas do cotidiano político, o que não implica em serem leigos absolutos. Ninguém vence uma eleição para tão almejados cargos sendo leigo. Ou pobre.

Na quinta-feira passada, 18 de maio, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, ao abordar a delação de Joesley Batista, dono da JBS, sobre o presidente da República, Michel Temer, e, o senador Aécio Neves, disse vivermos tempos estranhos nesta sofrida República. Não há como divergir de nosso eminente ministro, popularmente conhecido como Voto Vencido, porém há como ampliarmos o núcleo de sua abordagem sobre tempos estranhos: a política ocidental como um todo vive um momento de descrédito.

Negar o momento de desconfiança e crise generalizada sobre a classe política brasileira seria como negar o calor do fogo, mas isolá-la também seria incoerente. Diferentemente de nossa crise econômica e financeira que comprovadamente é acíclica quando comparada ao restante dos países emergentes e de economias de mercado, a crise política local faz parte de um cenário macro maior, ainda que circuncisada por aspectos particulares.

Podemos abordar alguns de nossos aspectos: crise ética, moral, falência de modelos estabelecidos, escândalos de corrupção e de influência. Ao contrário de décadas atrás, atualmente é dificultoso achar um jovem promissor e idealista que aponte um político como seu espelho e inspiração. E quando o aponta, dificilmente não será confrontado com outras verdades.

Os eleitores brasileiros, franceses e norte-americanos recentemente tiveram um dilema em comum: caramba, em quem eu voto? As pessoas temem o desconhecido, mas tempos de crises não se remediam com mais do mesmo. O descrédito da classe política norte-americana levou a ascensão de um empresário e popstar, Donald Trump, que apesar de republicano filiado já havia anos nunca almejou qualquer pretensão política. Sua primeira e certeira pretensão foi a de presidir os Estados Unidos da América. Assim parece até mesmo simples, mas ora não é. Os últimos dois presidentes dos EUA saíram da presidência com níveis recordes de desaprovação, sendo inclusive eleitos os dois piores presidentes desde a Segunda Guerra Mundial, Barack Obama, o pior, e George W. Bush logo à frente. O Partido Democrata foi incapaz de propor algo substancialmente novo, ofertando a ex-primeira-dama e ex-secretária de Estado, Hilary Clinton, seria apenas uma continuação do governo Obama, uma dose a mais de Bill Clinton. Não era o que esperava a imensa maioria dos norte-americanos. A descrença em mais um político para este cargo levou as pessoas a buscarem o desconhecido caminho: Donald Trump. O sintoma foi comum em São Paulo e França. O sintoma em algo ortodoxo ocorreu também no Canadá. E vai continuar ocorrendo.

João Dória Júnior, apesar de inúmeros familiares envolvidos com a política, e, pessoalmente, filiado ao PSDB desde 2001 sempre foi lembrado enquanto empresário de sucesso, como gestor privado, isto o levou até mesmo a entrar na lista das 100 pessoas mais poderosas do Brasil, pela Revista Istoé. Sem qualquer cargo eletivo anterior, com pouca resistência interna, João Dória Jr. se tornou a revelação do ninho Tucano em 2016, ao se eleger, ainda em primeiro turno (fato que não ocorria desde 1992), prefeito de São Paulo, deixando para trás o candidato a reeleição, Fernando Haddad (PT) e nomes tarimbados como Marta Suplicy (PMDB) e Luiza Erundina (PSOL). Mais uma clara aposta ao desconhecido. Entenda o desconhecido aqui como aquele dito no começo desta abordagem, no cotidiano político, não social.

Ora ora ora, chegamos em Emmanuel Macron. O badalado novo presidente francês. Eleito presidente da 6ª maior economia e comandante-em-chefe da 5ª mais poderosa força armada deste mundo com apenas 39 anos. Sem sequer ter concorrido a qualquer outro cargo. Sua carreira política se resumiu a secretário-geral adjunto à Presidência da República e ministro da economia. Até que trocar o cargo máximo da economia de um país para ser presidente não é novidade, temos o nosso próprio exemplo: Fernando Henrique Cardoso. Bem, é verdade, mas FHC havia disputados outras eleições, sido constituinte e nome conceituado e respeitado na política tupiniquim. O que torna Macron mais surpreendente ainda é o fato deste ter enfrentado e vencido em 2º turno uma candidata de extrema direita, Le Pen, quando toda a Europa e demais estados ocidentais tem demonstrado preocupante flerte com o radicalismo político e intolerância. Engenheiro do próprio destino, fundador do próprio partido, incrivelmente tão reverenciado quanto rompido com a velha política francesa.

Há um sentimento de desesperança na classe política generalizada nas democracias ocidentais. É inegável observar e constatar que as pessoas encontram-se fartas do político de carreira. Um paralelo comum entre Trump, Dória e Macron são suas ascensões políticas meteóricas e rompimento com o conceito prévio de político. Não necessariamente podemos considerar eles como apostas, em alguns aspectos o são. Em outros, nem tanto. E veja, não necessariamente é uma guinada à extrema direita. Macron é um candidato de centro-esquerda. Trump um republicano conceitualmente de extrema direita.

Os inúmeros escândalos que recaem sobre os que ocupavam o poder fundamentam grande desconfiança. Os e-mails nada profissionais de Hilary Clinton enquanto era Secretária de Estado dos EUA, contra Trump. O envolvimento de Haddad nos escândalos do PT, contra Dória. Os funcionários fantasma de François Fillon na França, contra Emmanuel Macron. A incapacidade da velha política e do velho pensamento em solver os problemas demandados pelo novo mundo, pela velha e nova população.

O mundo tem se reinventado com uma velocidade que a política não tem acompanhado. E continuará. A reinvenção de muitos conceitos de nossa sociedade é passo elementar e a política já foi abocanhada.

*Bruno Dourado Bertotto Martins é Acadêmico de Direito da Universidade Federal da Grande Dourados.

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