Milionário e José Rico começaram a carreira em Dourados

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Mário Perrupato em frente da loja onde funcionava a barbearia do pai dele com o primeiro LP da dupla. Foto - Divulgação
Mário Perrupato em frente da loja onde funcionava a barbearia do pai dele com o primeiro LP da dupla. Foto – Divulgação

Muitos fãs não imaginam que foi justamente em Dourados que a dupla deu o pontapé inicial à sua carreira. Numa época em que todos falam de músicos sertanejos do Estado que conquistaram fãs pelo mundo, como Michel Teló e Luan Santana, podemos afirmar que a relação de Mato Grosso do Sul com o sucesso na música sertaneja é muito mais antiga. Inclusive, vale citar músicos importantes como Zacarias Mourão e a dupla Délio e Delinha, entre muitos outros.

A história do início da carreira de Milionário e José Rico é baseada nos depoimentos de moradores da cidade, que acolheram e ajudaram os músicos no início da trajetória musical. José Alves dos Santos, mais conhecido como José Rico, chegou à Dourados no final dos anos 60, sozinho, sem dinheiro, e com um enorme talento. Logo fez amigos, como João Armando Perrupato, radialista e compositor que possuía uma barbearia na Avenida Marcelino Pires, em frente do antigo Bar Pinguim. José Rico passou a fazer vários “bicos” pela cidade, para se sustentar, inclusive varrendo o chão da barbearia de Perrupato. Conforme os relatos, ele sempre andava pela cidade com seu violão e todos gostavam muito de ouvi-lo cantar e tocar.

O radialista Gilberto Orlando, que conheceu José Rico enquanto o músico morava na cidade, conta que o cantor se apresentava na rádio onde ele tinha programa. “Ele sempre frequentava a rádio. Nós jogávamos bola no time de futebol da Rádio Clube de Dourados e ele se apresentou algumas vezes no programa que eu fazia. Ele cantava sozinho, só depois que o Milionário veio”.

Cerca de dois anos depois, o mineiro Milionário Romeu Januário de Matos, chegou a cidade e logo conheceu José Rico, porque ambos frequentavam o mesmo círculo de amizades. A afinidade entre os dois foi percebida rapidamente. Acabaram formando a dupla que se tornaria um grande sucesso no Brasil e no exterior. Perrupato, acreditando no sucesso da dupla, juntou suas economias, junto com Salvador Pinheiro, conhecido empresário de cantores sertanejos da época e foram para São Paulo para gravar o primeiro LP de Milionário e José Rico, em 1973, pela gravadora Califórnia.

Primeiro LP da dupla tem dedicatória do radialista Perrupato na contracapa

Mulher de Salvador Pinheiro, Chinita Pinheiro mostra a casa em que José Rico morava nos fundos em Dourados. Foto - Divulgação
Mulher de Salvador Pinheiro, Chinita Pinheiro mostra a casa em que José Rico morava nos fundos em Dourados. Foto – Divulgação

Na contracapa do primeiro disco de Milionário e José Rico, a foto e uma dedicatória de Perrupato, já prevendo o sucesso da dupla: “A riqueza pode ser reconhecida nas mais diversas formas. Milionário e José Rico são ricos em talento, motivo pelo qual, dentro de algum tempo, não lhes faltará riqueza de nenhuma espécie”.

O tipógrafo Mário Perrupato, filho de João Armando, se emocionou ao relembrar a história dos músicos na cidade. Ele conta que é uma história muito bonita e que pouca gente conhece. Mário guarda diversas recordações da época, inclusive cópias do primeiro LP da dupla e diversas fotos. “José Rico tinha 20 e poucos anos quando chegou aqui e meu pai acolheu ele. Chegou sozinho e precisando trabalhar. Da última vez que eles vieram fazer show aqui, eu fui até o hotel em que eles estavam e fui para o show com eles. Até me convidaram para subir no palco, mas eu não fui porque sou caipira”. No entanto, Mário fica magoado ao lembrar que é sempre ele quem procura a dupla para manter contato.

Dona Marta Perrupato, de 87 anos, mulher do falecido João Armando, conta que ainda recebe R$ 50 por mês pelos direitos autorais das composições do marido cantadas pela dupla: “Eles tinham talento, todo mundo gostava. Se eles quiserem vir aqui em casa, vou tratar muito bem. Eles ainda voltaram algumas vezes para nos visitar depois que fizeram sucesso, mas depois que meu marido morreu, nunca mais os vi”.

Depois que a dupla gravou o primeiro LP, contou com a ajuda de Perrupato e Salvador Pinheiro para se apresentar em circos pequenos, o que naquela época estava no auge. Perrupato inclusive comprou um circo para que a dupla pudesse cantar. Logo começaram a percorrer o Estado e o país se apresentando em circos.

Gilberto Orlando conta que muitos cantores sertanejos vinham à época se apresentar no Estado. “Aqui era o lugar. Tinha muito circo pequeno, para duas mil pessoas. Vinha muita gente de São Paulo para cá. O Salvador Pinheiro era um empresário importantíssimo da época, inclusive Milionário e José Rico ficavam na casa dele quando vinham para cá. O Pinheiro empresariava também o Zino e Zalo, Lino e Léo, Zé Fortuna e Pitangueira, Tião Carreiro e Pardinho e muitos outros”, relembra.

A mulher de Salvador Pinheiro, dona Chinita Pinheiro, conta com emoção que José Rico morava nos fundos de sua casa. “Ele é como um filho para mim, sempre que vem fazer show na cidade, vem me visitar”. No entanto, dona Chinita não guarda nenhum retrato nem disco da época, porque sua religião não permite. “Eu tive que me desfazer das várias caixas”.

Depois que Milionário e José Rico saíram do Estado e começaram a percorrer o país, estouraram cantando sucessos como “Estrada da Vida”, música lendária que estourou em todo país, e acabaram se mudando para São Paulo.

O filme “Na estrada da Vida” conquistou o primeiro lugar no “Festival Internacional de Filmes de Brasília” e foi vendido para diversos países, inclusive a China, país em que foram convidados pelo próprio Governo a se apresentarem. A excursão para a China, que aconteceu em 1985, durou um mês, e a dupla mostrou sua música para o “outro lado do mundo”. Milionário e Jose Rico foi a primeira dupla brasileira que visitou esse país.
Ficou uma certa mágoa da falta de lembrança da dupla pelos amigos

O advogado João Tibiriça Martins Ferreira, amigo da família Perrupato contou que, apesar da família gostar da dupla, sente certa mágoa por causa do sumiço da dupla após o sucesso. “Eles nunca foram visitar a família que tanto os ajudou no início da carreira. O Perrupato morreu pobre, nunca teve ajuda financeira, principalmente do José Rico, que era quem mais teve contato”. Ele conta que resolveu falar sobre o assunto não por interesse, porque acha que foi ingratidão da dupla não manter contato após do sucesso. “Eles usufruíram de tudo que a cidade tinha para oferecer e ajudar na carreira”.

Músicos já gravaram 29 discos e venderam mais de 35 milhões de LPs

Dona Marta, de 87 anos, mulher do falecido João Armando Perrupato. Foto - Divulgação
Dona Marta, de 87 anos, mulher do falecido João Armando Perrupato. Foto – Divulgação

Uma das duplas mais famosas do país, Milionário e José Rico já venderam mais de 35 milhões de exemplares de seus 29 discos gravados desde 1973. Além disso, gravaram dois DVDs e dois filmes, “Na Estrada da Vida”, de 1980, e “Sonhei com Você”, de 1988. Milionário Romeu Januário de Matos nasceu em Monte Santo de Minas, em Minas Gerais, no dia 4 de janeiro de 1940. Trabalhou como pedreiro, garçom e pintor de parede. Começou a se interessar pela música ouvindo sua mãe cantar, sendo um autodidata, porque aprendeu a cantar e a tocar sozinho.

José Rico Alves dos Santos, apesar de ter nascido em Pernambuco, foi criado em Terra Rica, no Paraná, desde os dois anos de idade, por isso adotou o nome de José Rico, em alusão à cidade onde viveu. O apelido, que foi inventado por um padre ainda na infância, foi registrado em cartório anos mais tarde.

A dupla, que se formou no início dos anos 70, se chamava inicialmente Tubarão e José Rico. Foi no programa de calouros de Silvio Santos que a dupla passou a se chamar Milionário e José Rico. Após anos de sucesso e depois de 20 LPs lançados, a dupla anunciou a separação, que durou três anos. Após tentarem carreira solo, se uniram de novo.
Milionário e José Rico

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